A arquitetura singular do Pagode Branco, um santuário budista do século XIII situado no distrito de Xicheng, em Pequim, apresenta um desafio visual: sua sombra é quase imperceptível. Essa peculiaridade inspirou uma lenda urbana fascinante: diz-se que a sombra do templo se projeta a impressionantes três mil quilômetros de distância, no Tibete, considerado o coração espiritual do budismo.
Pagode Branco é também uma figura central no filme “A Torre Sem Sombra” do cineasta chinês Zhang Lu, que retrata Pequim com uma rara ternura e admiração. Além disso, o pagode serve como uma poderosa metáfora para um momento decisivo na vida, aquele instante em que passado e futuro parecem pesar igualmente, deixando-nos desorientados e sem direção, assim como quando o sol está a pino e não se vê sombra alguma.
Gu Wentong (interpretado por Xin Baiqing), um crítico gastronômico de moderado sucesso e pai ocasional de Smiley (Wang Yiwen), uma menina alegre e inteligente, encontra-se nesse exato ponto de inflexão. Residente de longa data em Pequim, Gu é um pai amoroso, embora distante, e sua filha é cuidada principalmente por sua irmã Wenhui (Li Qinqin) e pelo marido dela, Li Jun (Wang Hongwei). Gu, que também é um escritor com uma paixão não correspondida pela poesia, está divorciado da mãe de Smiley e recentemente perdeu a própria mãe. Seu passado é marcado por uma tragédia familiar: aos cinco anos, seu pai foi acusado de um crime sexual em um ônibus público, e desde então, após ser expulso de casa pela mãe, Gu não teve mais contato com ele.
Esses eventos do passado são como sombras que persistem em nossas vidas, influenciando nossos comportamentos e ações. São os hábitos que adotamos de nossos pais ou os gestos que, sem perceber, imitamos e que agora fazem parte de quem somos. Gu observa uma mulher praticando uma técnica de relaxamento ao massagear os lóbulos das orelhas em um ônibus, e isso o faz refletir sobre as marcas invisíveis que carregamos conosco.