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Riefenstahl (2025) - Crítica

 Análise Crítica do Documentário "Riefenstahl": A Glorificação e o Legado de uma Diretora Nazista

O novo documentário “Riefenstahl”, dirigido por Andres Veiel, oferece uma perspectiva profunda e sombria sobre Leni Riefenstahl, uma das cineastas mais controversas da história do cinema. Conhecida principalmente por seus filmes de propaganda nazista, como “Triumph of the Will” e “Olympia”, Riefenstahl conseguiu ao longo das décadas manter uma imagem de artista visionária, distanciando-se de seu envolvimento com o regime de Hitler. No entanto, como este documentário revela, sua relação com o nazismo não pode ser facilmente dissociada de sua obra, e a tentativa de separar sua arte de sua ideologia revela-se um erro. Veiel, com a colaboração de Sandra Maischberger, tem como objetivo destruir a ideia de que Riefenstahl era apenas uma artista inocente que se perdeu em um sistema político monstruoso. Ao contrário, ele argumenta que ela foi uma colaboradora ativa e um reflexo das ideologias que ajudaram a perpetuar.

Riefenstahl: A Diretora Propagandista

O impacto de Leni Riefenstahl no cinema não pode ser subestimado, especialmente com filmes como “Triumph of the Will”, que documentou o rally de Nuremberg de 1934 e elevou Hitler a uma figura quase mítica através de planos de câmera impressionantes e uma abordagem visual que glorificava o regime nazista. As cenas de baixo ângulo, com Hitler contra o céu, não são apenas uma escolha estética, mas uma clara tentativa de transformá-lo em uma figura heróica. A capacidade de Riefenstahl em criar uma estética poderosa e simbólica para o regime de Hitler foi uma das razões pelas quais ela foi considerada uma das maiores cineastas de sua época, apesar da clara agenda política de seus filmes.

No entanto, é difícil ignorar o fato de que essas imagens não existiram no vácuo. O documentário de Veiel investiga como Riefenstahl trabalhou de forma consciente e ativa para cultivar uma imagem pública favorável, especialmente após o fim da Segunda Guerra Mundial. Ela construiu uma narrativa que a apresentava como uma artista inocente que simplesmente se aproveitou dos recursos oferecidos pelo regime nazista para criar suas obras. Ela alegava que sua arte não tinha conotações políticas, mas, como este documentário revela, isso parece ser uma mentira conveniente para esconder sua verdadeira lealdade.

O Encobrimento da Realidade: Riefenstahl e a Propaganda Nazista

Veiel constrói um caso contundente de que Riefenstahl não apenas ignorou as atrocidades do regime nazista, mas de fato as apoiou em sua publicidade e imagem cinematográfica. Ao acessar mais de 700 caixas de arquivos de Riefenstahl, Sandra Maischberger encontrou evidências que mostram que ela estava longe de ser uma espectadora passiva. Riefenstahl gravou conversas telefônicas nos anos 60 e 70 com Albert Speer, um dos principais arquitetos do regime, nas quais ela expressava nostalgia pelos “velhos tempos” do nazismo. Esses arquivos privados revelam uma Riefenstahl que não se arrepende de seu envolvimento com o regime, mas sim alguém que mantinha a esperança de que o nazismo pudesse ser resgatado. Ela também foi encontrada organizando cartas de ódio que recebia, incluindo uma categoria de "Judeus", algo que desmente suas alegações de desinteresse político.

A Defesa de Sua Arte: A Luta pelo Reconhecimento

Riefenstahl se tornou uma defensora feroz de seu trabalho, especialmente nos anos pós-guerra. Em entrevistas dos anos 60 a 90, ela insistia que sua arte era pura e desinteressada, focada apenas na beleza e na representação de corpos humanos ideais. Durante uma entrevista em 1976, ela chegou a rejeitar a ideia de filmar pessoas com deficiências, argumentando que estava interessada apenas em capturar a "beleza". Essa ênfase no corpo perfeito e na representação de uma humanidade idealizada é uma característica central de sua obra, mas também um reflexo de suas opções estéticas profundamente alinhadas com a ideologia nazista.

O documentário de Veiel faz uma análise cuidadosa de como essa defesa intransigente de sua arte contribuiu para sua imagem pública de artista incompreendida, enquanto ela de fato continuava a minimizar ou ignorar os horríveis feitos do regime nazista. Mais chocante ainda são as evidências de como ela usou seu status de cineasta famosa para agregar apoio a ideias de extrema-direita, encorajando muitos que ainda defendiam o regime a se expressarem sem culpa. Ela se tornou um símbolo de alguém que poderia reivindicar um status de artista, enquanto continuava a sustentar ideologias perigosas.

A Mentira Contínua e a Negação dos Crimes

Outro ponto central do documentário é a exposição da mentira contínua de Riefenstahl sobre sua relação com os crimes do regime. Em várias ocasiões, ela mentiu abertamente sobre sua participação em eventos que envolviam a morte de civis, incluindo judeus. Veiel constrói uma narrativa convincente, que sugere que Riefenstahl estava ciente das atrocidades, mas escolheu fechar os olhos ou até mesmo colaborar com a máquina de guerra nazista. A sua atuação como fotógrafa de guerra logo após a invasão da Polônia e a possível implicação em massacres de civis tornam claro que ela não era uma observadora inocente, mas uma participante ativa que buscava construir imagens cinematográficas a qualquer custo.

Arte, Política e o Legado de Riefenstahl

Veiel deixa para os espectadores a difícil tarefa de formar uma conclusão definitiva sobre Riefenstahl. A questão de se pode ou não separar a arte da ideologia é central para a discussão. Como o documentário aponta, não se pode separar a obra de Riefenstahl de suas intenções políticas. Sua arte não foi simplesmente uma busca por beleza estética, mas uma ferramenta poderosa usada para glorificar um regime totalitário.

Além disso, o documentário falha em conectar de forma mais clara as técnicas estéticas de Riefenstahl com as formas de manipulação visual utilizadas até hoje por movimentos de extrema-direita. Embora a obra de Riefenstahl tenha influenciado profundamente a cinematografia e a cultura visual, a falta de uma análise mais profunda sobre como seus métodos continuam a ser usados de forma perigosa na política contemporânea é uma lacuna significativa.

“Riefenstahl” apresenta uma visão vital e crítica sobre uma das figuras mais controversas da história do cinema, mas poderia aprofundar ainda mais suas conexões entre arte e ideologia. Sua estreia no Festival de Cinema de Veneza de 2024 marca o início de um esforço mais amplo para reavaliar o legado de uma cineasta que, por muito tempo, foi vista com indulgência, mas cuja verdadeira natureza como colaboradora e propagandista deve ser entendida e reconhecida.

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