Ripperland #1: Um Mergulho no Passado e no Futuro Através de uma Londres Distópica
O quadrinho Ripperland #1, lançado pela Dark Horse Comics e com roteiros de Steve Orlando e John Harris Dunning, é um verdadeiro desafio narrativo. A história se passa no ano 2188, quando Jack, o Estripador, retorna a Londres, em uma versão futura de uma Inglaterra devastada pelo Brexit e transformada em um parque temático vitoriano, sob proteção militar e financeira dos Estados Unidos. O assassinato de um herdeiro americano, em pleno coração de Londres, ameaça desestabilizar esse frágil equilíbrio. A história mistura mistério policial com um forte comentário político, mas sofre com uma execução irregular, especialmente no que diz respeito ao ritmo e à clareza da narrativa.
Uma Inglaterra Pós-Brexit: Um Parque Temático Vitoriano
A premissa de Ripperland #1 é, sem dúvida, intrigante: uma Inglaterra transformada em um gigantesco parque temático vitoriano, onde os resquícios de uma nação pós-Brexit sobrevivem à custa da proteção americana. Esse cenário de um futuro distópico propõe uma crítica feroz às consequências do Brexit e à relação de subordinação da Inglaterra aos Estados Unidos. A história não se limita apenas a um mistério de assassinato, mas também se utiliza do formato de quadrinhos para lançar uma reflexão sobre imperialismo, identidade nacional e colonialismo moderno.
O assassinato de um herdeiro de um império midiático americano é o catalisador da narrativa. O protagonista, Jesse Holden, um agente especial americano, se junta a Edwin Fogg, um detetive local de estilo vitoriano, para investigar o crime. A combinação desses dois personagens com ideologias e métodos conflitantes é, sem dúvida, uma das forças da narrativa. No entanto, as primeiras páginas da revista são um tanto desorientadoras, pois a história precisa servir não só à construção do mistério, mas também à exposição política e social do mundo fictício de Ripperland.
Desafios na Construção do Mundo e no Ritmo da História
Apesar de seu conceito promissor, Ripperland #1 enfrenta dificuldades em equilibrar os vários elementos que busca apresentar. O primeiro número se dedica bastante ao worldbuilding, uma necessidade óbvia para situar o leitor nesse futuro alternativo, mas a entrega de informações através de uma longa e forçada exposição verbal compromete o ritmo da história. Em um momento particularmente problemático, um dos personagens faz uma longa explicação sobre o estado atual da Inglaterra pós-Brexit, como se não houvesse nenhuma necessidade de sutileza. A fala, excessivamente detalhada e claramente desnecessária para o personagem receptor, interrompe o fluxo narrativo e prejudica a imersão do leitor.
Esse momento de infodumping (explicação excessiva e desnecessária) soa artificial e forçado, prejudicando a tensão que havia começado a ser construída com o assassinato. Esse tipo de abordagem narrativa, onde o texto se sobrepõe à ação, enfraquece o impacto dramático da história e gera uma sensação de irregularidade no ritmo, algo que continua a afetar o restante da edição.
O Estilo Artístico: Exagero e Divertimento, Mas Sem Tensão
O trabalho artístico de Alessandro Oliveri apresenta uma Londres exagerada e ligeiramente surreal. O desenho das roupas e arquitetura é grandioso, como se o ambiente fosse uma máquina do tempo que ficou presa no século XIX. Essa escolha estética ajuda a reforçar a ideia de um parque temático vitoriano, mas, ao mesmo tempo, cria uma desconexão emocional com os momentos de tensão. A escala exagerada dos edifícios e o estilo dramático das expressões faciais contribuem para um tom cartunesco, que muitas vezes entra em conflito com a gravidade do assassinato e das questões políticas em jogo.
A escolha do artista em representar emoções exageradas também diminui a seriedade do ambiente. As expressões faciais dos personagens são frequentemente distorcidas e amplificadas, algo que, em vez de criar profundidade psicológica, acaba por reduzir a tensão que se esperaria de uma história de mistério.
O Uso das Cores: Contraste e Exagero
Em termos de cores, Vivaldi acerta ao complementar o estilo artístico de Oliveri. Durante o dia, os ambientes são ricos em cores vibrantes, mas quando a noite chega, a paleta se torna mais sombrea e dramática. Apesar de a iluminação e o contraste funcionarem bem para destacar os personagens e suas roupas, o uso excessivo de cores também parece retirar um pouco da seriedade da narrativa.
Essa abordagem visual exagerada e de alto contraste, enquanto eficaz para alguns aspectos da história, acaba por minar a gravidade emocional dos momentos mais intensos, como o assassinato ou os momentos de conflito entre os personagens principais.
A Promessa de um Potencial Não Realizado
Ripperland #1 é uma obra que apresenta um conceito muito promissor, mas que se perde no equilíbrio entre mistério, crítica social e desenvolvimento de personagens. A combinação de uma Londres distópica, com elementos de política moderna e referências ao Jack, o Estripador, poderia ser o ponto de partida para uma história fascinante. No entanto, a execução dessa narrativa é irregular, com altos e baixos no ritmo e no desenvolvimento da tensão.
A principal dificuldade do primeiro número é que ele tenta ser tudo ao mesmo tempo — um mistério policial, uma crítica política, uma história de resistência e um drama de personagens — mas não consegue integrar esses elementos de maneira fluida. Ripperland #1 é, portanto, uma edição que deixa o leitor com a sensação de que o potencial de sua narrativa ainda não foi completamente realizado, mas que pode evoluir à medida que a série avança.
Um bom começo, mas Ripperland precisa de um melhor equilíbrio e fluidez para se tornar uma história cativante e coerente em seus próximos números.
Ripperland #1 é publicado pela Dark Horse Comics e está disponível a partir de 29 de janeiro de 2025.