Orlando, My Political Biography (2023) - Crítica

"Orlando, My Political Biography" é o título do filme do filósofo e cineasta transgênero Paul B. Preciado, que se inspira no romance homônimo de Virginia Woolf, publicado em 1928. 

O livro narra a história de um nobre inglês que vive por séculos, mudando de sexo e de época, sem perder sua identidade. O filme de Preciado, porém, não é uma adaptação literal da obra literária, mas uma reflexão crítica e criativa sobre as questões de gênero, sexualidade e política que ela suscita.

O filme se abre com cenas do próprio Preciado colando cartazes nas paredes de uma cidade noturna. Os cartazes trazem frases provocativas, interrogativas e enigmáticas, como "Orlando sou eu", "Orlando é você", "Orlando é um vírus", "Orlando é uma revolução". Essas frases anunciam o tom e o método do filme, que não segue uma narrativa linear ou convencional, mas se compõe de fragmentos, experimentos e intervenções que desafiam as normas e as convenções sociais.

O filme convoca uma série de artistas trans e não binários para encarnar diferentes versões de Orlando ou para se apresentar como pessoas que se chamam Orlando. Entre eles estão Oscar S Miller, Janis Sahraoui, Brigitte Vasallo, Virginie Despentes e Paul B. Preciado. Cada um deles participa de cenas dramáticas ou cômicas, às vezes inspiradas no livro de Woolf, às vezes inventadas pelo cineasta. Essas cenas exploram as dificuldades, os desejos e as alegrias de quem vive uma identidade trans ou não binária em um mundo que ainda impõe padrões rígidos e violentos de gênero.

Preciado também se coloca como narrador e comentarista do filme, usando sua voz rouca e grave para tecer considerações sobre o romance de Woolf e sua relação com sua própria experiência de transição. Ele critica o livro por omitir os aspectos materiais e políticos da mudança de sexo de Orlando, como os hormônios, as cirurgias, os documentos legais e as discriminações sociais. Ele também questiona a ideia de que Orlando mantém sua identidade ao longo dos séculos, sugerindo que a identidade é sempre um processo dinâmico e mutável.

O filme usa uma estética que remete aos filmes-ensaio do cineasta francês Jean-Luc Godard, especialmente os da fase posterior a 1980. O uso de textos na tela, com uma fonte semelhante à usada por Godard em alguns de seus filmes dessa época, é um exemplo disso. Outro exemplo é a forma como o filme mistura diferentes registros visuais e sonoros, como imagens documentais, ficcionais e artísticas, música clássica, rock e rap, citações literárias e filosóficas. O filme também incorpora elementos da cultura pop, como referências ao filme "Orlando", dirigido por Sally Potter em 1992 e estrelado por Tilda Swinton.

"Orlando, My Political Biography" é um filme que celebra a diversidade e a resistência das pessoas trans e não binárias, ao mesmo tempo em que propõe uma leitura crítica e atualizada do clássico de Virginia Woolf. É um filme que convida o espectador a questionar suas próprias certezas sobre gênero e sexualidade, e a se abrir para as possibilidades infinitas de ser Orlando.

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